A rotina na universidade já não começa mais com um professor abrindo a porta e escrevendo o tema do dia no quadro. Para muitos estudantes, a verdadeira “aula zero” acontece antes mesmo de chegarem ao campus, guiada por vídeos curtos, tutoriais expressos e explicações rápidas que aparecem no feed. É a geração que, antes de enfrentar uma equação, um texto complexo ou um experimento, vai correndo ao celular para ver se algum criador já decifrou aquilo de um jeito mais leve.
Ao mesmo tempo em que isso parece prático, abre uma discussão gigante: estamos aprendendo mais… ou só mais rápido? E até que ponto um algoritmo, com seus interesses próprios, deveria influenciar o jeito como estudamos?
A nova porta de entrada para o conhecimento
Hoje, o estudante não precisa esperar a aula presencial para entender um conteúdo. Se surgir uma dúvida na noite anterior à prova, lá está o vídeo de cinco minutos explicando aquilo que parecia indecifrável. O interessante é que esse comportamento não aparece do nada: ele nasce da combinação entre curiosidade, falta de tempo, vida corrida (e claro) a maneira como redes sociais impulsionam conteúdos educacionais.
Os vídeos respondem dúvidas pontuais, aliviam a ansiedade e preparam o terreno para o aprendizado formal. Em vez de chegar “cru” à sala, muita gente chega aquecida. Só que existe um porém: embora o formato rápido ajude, ele também condiciona o cérebro a preferir explicações instantâneas, o que pode dificultar a concentração em aulas tradicionais.
Quando o algoritmo vira tutor extraoficial
O algoritmo não escolhe o que é mais aprofundado, mas o que tem mais chances de manter o aluno preso à tela. O problema é que isso cria uma “bolha educacional”, em que o estudante consome explicações repetidas, superficiais ou até imprecisas, sem perceber.
E isso impacta diretamente o desempenho acadêmico. Afinal, se a base de estudo está sendo moldada por interesses de plataformas e não por necessidades pedagógicas, há um distanciamento entre o que a universidade ensina e o que o aluno consome no dia a dia.
Nós já exploramos essa relação entre redes sociais e educação em outros conteúdos, como na análise sobre como o TikTok e o Instagram influenciam nos estudos. Vale a leitura para entender como esse comportamento ganhou força: https://hicampi.com/como-o-tiktok-e-o-instagram-estao-impactando-os-estudos/.
O papel da curadoria digital
Diante desse cenário, surge uma nova habilidade essencial: saber filtrar. O estudante atual não precisa apenas estudar, mas aprender a identificar o que realmente é útil. É quase como montar uma playlist de estudos: nem todo vídeo que aparece é relevante, e nem toda explicação rápida substitui uma aula completa.
Uma boa estratégia é combinar os vídeos com conteúdos oficiais da disciplina, anotações e dúvidas anotadas para serem discutidas depois com professores. Assim, o aprendizado ganha profundidade e não fica refém apenas de recomendações do algoritmo.
Como a universidade encara essa mudança de comportamento?
Muita gente imagina que as instituições de ensino ignoram esse novo jeito de aprender, mas a verdade é que a universidade já percebeu que a geração atual chega às aulas com outro ritmo. Professores comentam que os primeiros minutos viraram quase um “ajuste de frequência”: enquanto eles entram no modo explicação completa, os alunos ainda estão no modo aprendizado rápido, moldado pelos vídeos que consomem no dia a dia.
Algumas universidades começaram a adaptar suas metodologias, oferecendo trilhas híbridas, micro vídeos institucionais e até atividades que conectam as aulas presenciais a recomendações de plataformas digitais. Outras ainda resistem. Mas, de forma geral, existe uma percepção crescente de que o hábito de assistir tutoriais antes das aulas não vai desaparecer e que ignorar isso só cria um abismo maior entre professor e aluno.
Mais do que disputar atenção, universidades buscam maneiras de transformar esse comportamento em um aliado. Em vez de competir com vídeos de 30 segundos, elas começam a incorporar elementos de comunicação mais visual e dinâmica em suas práticas.
A evolução do “pré-estudo”
O hábito de buscar vídeos antes da aula não é necessariamente um vilão. Na verdade, ele pode ser um impulsionador poderoso quando usado de maneira equilibrada. Essa antecipação ajuda a quebrar bloqueios, reforça o entendimento e até melhora a participação em sala.
Mas essa prática também exige consciência. Muitos estudantes ficam presos à sensação de que só aprendem se alguém explicar tudo em 30 segundos. Isso reduz a tolerância ao esforço mental e pode criar dependência de conteúdos mastigados.

O impacto do algoritmo na motivação dos estudantes
Se por um lado o algoritmo entrega exatamente o conteúdo que o estudante “quer ver”, por outro ele também interfere na motivação acadêmica. Isso porque vídeos rápidos ativam um sistema de recompensa instantânea, enquanto estudar de verdade exige paciência, repetição e certo desconforto cognitivo.
Quando o cérebro se acostuma ao fluxo constante de respostas prontas, a tolerância ao esforço diminui. A consequência aparece na sala de aula: alunos que desanimam rapidamente, que sentem que “não conseguem aprender”, quando na verdade só estão comparando um processo natural de estudo a um vídeo de 20 segundos.
Por outro lado, há o efeito oposto: estudantes extremamente motivados, que usam o algoritmo como trampolim para descobrir temas novos, referências inesperadas e abordagens criativas de aprendizagem. Tudo depende da curadoria e da consciência no uso.
Video-aulas que viram horas complementares
O consumo de vídeos educacionais também entrou no universo das horas complementares. Plataformas como YouTube e TikTok já possuem formatos considerados válidos em alguns cursos, desde que sigam critérios específicos. Já falamos sobre isso neste conteúdo completo: https://hicampi.com/horas-complementares-com-videos-no-youtube-e-tiktok/.
Essa possibilidade transforma o hábito de ver vídeos em algo útil academicamente — mas reforça a importância de escolher materiais de qualidade e de instituições confiáveis.
O que os professores estão percebendo na universidade?
Muitos docentes relatam que os alunos chegam às aulas com noções prévias mais claras, mas também com conceitos distorcidos. Explicações virais nem sempre estão corretas, e corrigir essas distorções exige tempo. Ainda assim, eles reconhecem que vídeos podem ser aliados valiosos se dialogarem com o conteúdo formal, e não o substituírem.
Como isso molda geração atual na universidade?
Essa geração cresce com múltiplas janelas de conhecimento: a sala de aula tradicional, os vídeos curtos, os tutoriais longos e as plataformas de streaming educativo. Esse mix cria estudantes mais independentes, curiosos e rápidos, mas também mais impacientes e seletivos.
Universidade: caminhando para um aprendizado híbrido e consciente
A real vantagem dessa nova dinâmica não está em escolher entre universidade ou algoritmo, mas em juntar os dois. A tecnologia encurta caminhos, tira dúvidas e ajuda a montar uma base inicial. Já a sala de aula aprofunda, contextualiza e cria raciocínio crítico, algo que nenhum feed pode substituir.
O segredo está em harmonizar esses dois mundos: usar os vídeos como apoio, sem deixar que eles ditem o que é ou não importante. No fim, o estudante que consegue transitar entre explicações rápidas e aulas completas tem uma vantagem enorme na formação.
E assim seguimos nessa mistura de telas, cadernos e recomendações automáticas, unindo o melhor dos dois universos. A verdade é que a universidade continua sendo o espaço onde tudo se conecta e onde o aluno transforma aquilo que aprendeu nos vídeos em conhecimento de verdade.
