O futebol brasileiro é mundialmente reconhecido pela sua leveza, criatividade e habilidade, características que encantam torcedores ao redor do mundo. Esses elementos têm uma forte ligação com a herança africana, que desempenhou um papel fundamental na formação do estilo de jogo único do Brasil. No entanto, a valorização dessa influência, tanto no futebol quanto em outras áreas culturais, ainda enfrenta obstáculos significativos. Com o tema do ENEM 2024 — “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil” — o futebol serve como um exemplo claro desses desafios e também dos avanços na luta pela inclusão e reconhecimento da cultura afro-brasileira.
A contribuição africana para o futebol brasileiro
A herança africana é uma das principais responsáveis pela formação do estilo futebolístico brasileiro. A famosa “ginga”, um movimento fluido e improvisado, é inspirada em práticas da capoeira e danças afro-brasileiras, conferindo ao futebol uma habilidade única que encanta o mundo. Jogadores históricos como Pelé, Garrincha e Zico tornaram-se ícones internacionais, personificando a ginga e a criatividade no futebol. Jogadores contemporâneos, como Neymar, Romário e Ronaldinho Gaúcho, continuam a tradição, transmitindo essa herança nas novas gerações.
Além do estilo de jogo, as relações com as religiões de matriz africana, como o candomblé e a umbanda, também são visíveis no futebol brasileiro. Muitos jogadores recorrem à fé nas divindades africanas, como os orixás, buscando proteção e força antes das partidas. Apesar do preconceito e do tabu em torno dessas práticas religiosas, a presença da fé no futebol reafirma a resistência e a importância da cultura afro-brasileira.
Desafios históricos e racismo no futebol brasileiro
Apesar da forte contribuição dos afrodescendentes para o futebol, a inclusão de jogadores negros no esporte sempre foi marcada por barreiras raciais. No início do século XX, o futebol era uma atividade elitista, predominantemente praticada por brancos, e jogadores negros enfrentaram exclusão e discriminação. Para contornar o racismo, alguns aplicavam pó de arroz no rosto para tentar parecer brancos, uma prática que evidencia a marginalização dos negros no esporte.
Embora o futebol tenha se popularizado entre as classes populares, o racismo estrutural persiste, com ofensas racistas nos estádios e nas arquibancadas, perpetuando a ideia de inferioridade dos jogadores negros. Isso reflete um problema maior da sociedade brasileira, que ainda não reconhece plenamente as contribuições culturais dos negros.
Obstáculos para a valorização da herança africana no futebol e na sociedade
O reconhecimento da herança africana no futebol brasileiro ainda encontra muitos obstáculos. Um dos maiores desafios é o racismo estrutural, que se reflete na desigualdade de oportunidades para jogadores negros, tanto nas categorias de base quanto no futebol profissional. Além disso, a mídia esportiva frequentemente reforça estereótipos sobre jogadores afrodescendentes, destacando sua “força física” e “agilidade”, mas minimizando suas habilidades táticas e técnicas. Esses estereótipos limitam a visão sobre o talento negro, ignorando sua complexidade e inteligência no jogo.
Esses desafios não se restringem apenas ao futebol, mas também à cultura em geral, onde a valorização da herança africana no Brasil ainda enfrenta resistência e falta de reconhecimento. Para superar esses obstáculos, é necessário um esforço coletivo de inclusão, educação e representatividade.
A importância da educação e representatividade para a valorização da herança africana
A educação é essencial para mudar a percepção sobre a herança africana no futebol e em outras áreas culturais. Ensinar a história do Brasil, incluindo as contribuições dos povos africanos, nas escolas é fundamental para construir uma visão mais justa e equilibrada. Incluir o papel dos afrodescendentes no desenvolvimento do futebol brasileiro pode ajudar a nova geração a reconhecer sua importância.
Além disso, a presença de afrodescendentes em posições de liderança no futebol — como treinadores, dirigentes e comentaristas — é crucial para garantir que a cultura afro-brasileira seja representada e respeitada. Políticas públicas e ações afirmativas podem promover a inclusão e diversificar essas posições, permitindo uma maior valorização da herança africana no esporte.
O papel do futebol na luta contra o racismo e pela valorização da cultura
O futebol, por ser um esporte de grande visibilidade, tem um papel poderoso na luta contra o racismo e na valorização da herança africana. Em 2020, o jogador Neymar Jr. foi alvo de ofensas racistas durante uma partida na França, e seu protesto contra a discriminação gerou um debate mundial sobre o combate ao racismo no esporte. A ação de clubes e federações para conscientizar o público e combater o racismo também é essencial. Times como Bahia, Corinthians e Vasco têm se destacado na promoção do respeito e da igualdade racial.
Impacto cultural além das quatro linhas
A influência africana no futebol brasileiro não se limita apenas ao estilo de jogo. Ela se estende para a música, os cantos e as celebrações que fazem parte do espetáculo. Ritmos como o samba, que têm raízes africanas, são frequentemente ouvidos nos estádios, e muitas comemorações de gols incluem movimentos inspirados em danças afro-brasileiras. Essa conexão entre futebol e cultura popular reforça a importância de reconhecer e valorizar a herança africana no Brasil.
Além disso, as comunidades negras desempenham um papel crucial no fomento do futebol amador e de várzea, sendo berço de muitos jogadores que brilham nos gramados profissionais. Esses espaços, que frequentemente enfrentam falta de apoio e infraestrutura, são um exemplo de resistência e criatividade, mantendo viva a ligação entre futebol e cultura afro-brasileira.
A necessidade de valorização e inclusão da herança africana no futebol brasileiro
A herança africana é uma parte essencial da identidade do futebol brasileiro, e reconhecer essa contribuição é fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. O tema do ENEM 2024 destaca a importância de se enfrentar o racismo e promover a valorização cultural no Brasil. A educação, a representatividade e o combate ao racismo são passos fundamentais para celebrar e reconhecer o papel dos afrodescendentes no futebol e em todas as áreas da cultura brasileira.
Ao celebrar essa herança, o Brasil não só garante justiça histórica. Mas, também honra a riqueza cultural que define o país — no futebol, na música, na dança e em tantas outras expressões da vida cotidiana.
Por Caroline Soares & Gabriela Bandeira.